sexta-feira, 9 de maio de 2014

#somostodosbananas




Interessante como às vezes um simples ato, um, digamos, contra-ataque, pode quebrar uma escrita e tornar as coisas diferentes. Há muito tenho percebido e pensado sobre esse tipo de atitude, mas ainda não consegui definir ou teorizar nada palpável para colocar no papel. Vamos à tentativa.
Houve uma polêmica semanas atrás com o já costumeiro preconceito racial que os europeus tem com relação a todos que estamos no hemisfério sul. Outra vez jogaram uma banana para um jogador não-europeu, um subdesenvolvido. Como eles se esquecem que aquilo que eles praticam lá só se parece um pouco com futebol por conta dos subdesenvolvidos?!
Mas, desta vez, houve uma reviravolta. Por Deus, como são emocionantes as reviravoltas desta nossa vida! Daniel Alves, lateralzaço multicampeão com o Barcelona, foi “presenteado” com uma banana, mas, ao invés de fazer bico e se portar como o sub-humano que eles pensam que somos, ele resolveu contra-atacar. O lateral pegou a banana, descascou-a e, com a naturalidade de quem sabe o que realmente é, comeu um pedaço. BRILHANTE!
O que mais se vê hoje em dia é gente se fazendo de coitada, reclamando do tempo, da vida, de tudo, mas não fazendo nada pra mudar. É gente querendo casa e gastando a grana no boteco, são pais querendo bons filhos e gastando muito tempo consigo próprios.
Claro, não posso me furtar em dizer que o que veio depois foi um desastre. Pra que não achem que aderi ao tal do #somostodosmacacos, quero que fique claro que pouca coisa que veio depois do brilhante gesto do Daniel Alves pode se aproveitar. Desde Neymar e seu imparável instagram até o zé ruela do Luciano Hulk, passando pelo povo maria-vai-com-as-outras do facebook, nunca vi algo tão legal virar uma coisas tão babaca.
Outro diferencial foi o que aconteceu com o tal torcedor de raça evoluída. O próprio clube, além da justiça, resolveu puni-lo. Agora ele nunca mais poderá entrar no estádio do time para o qual torce. Novamente BRILHANTE! Entretanto, aqui, no país do futebol, as coisas não acontecem desse jeito. Ano passado teve um torcedor do Corinthians que matou outro jovem torcedor adversário com um sinalizador. Uns doze torcedores vândalos ficaram presos na Bolívia por uns meses e assim que foram soltos voltaram para o estádio para barbarizar.
Pra não entrar na onda de só achar o que acontece de ruim e ressaltá-los além do devido, prefiro ficar com o que de bom aconteceu, ou seja, a reação de Daniel Alves ao racismo e a punição ao racista otário. Que possamos ver isso acontecer mais vezes daqui pra frente. #somostodosbananas

Márcio Antoniasi

terça-feira, 6 de maio de 2014

A balança torta dos justiceiros brasileiros

A multidão ensandecida grita: Mata!
Paus, pedras, espinhos, socos, cusparadas...
O sangue derramado nos justificou, afinal só o sangue derramado aplaca a ira de “deus”.
É necessário que este ser impuro seja sacrificado, para que nossa alma impura seja limpa...
Mas, qual o crime o cometido para que essa criatura de Deus seja castigada de tal maneira?
Acredita-se que seja adorador do demônio!
Nossa, então vamos extirpa-la do nosso meio...
E assim morreu Fabiane Maria de Jesus, de 33 anos. De Jesus estava internada, em estado gravíssimo, na UTI do hospital Santo Amaro desde Sábado (03) e veio a falecer ao terceiro dia do seu espancamento, na segunda-feira (05).
A multidão, ao saber de um boato espalhado pela internet de que a mesma havia sequestrado uma criança para realizar rituais de magia negra, resolveu agir, afinal, quando o Estado é omisso, é compreensível que o povo resolva fazer justiça.

Porém, após a justiça feita, viu-se que a dita justiça foi injusta, pois a mulher acusada de bruxaria tinha apenas cometido o crime de ser parecida com um retrato falado divulgado por um jornal. Ah, mas então vamos reparar o erro cometido...Infelizmente, para morte não há como se remediar.
O mal de se deixar o julgamento a cargo da multidão é que mesma não tem conhecimento total dos fatos e, por isso, tende a julgar pela emoção do momento.
Meu medo é que um dia saia um boato sobre mim, sobre meus familiares, amigos e que a próxima Fabiana seja próxima a mim. Meu pavor é que alguém que me é querido seja confundido com aquele que o povo ache que mereça a sua justiça. Fico assustado em pensar que a dor que sofreu os familiares dos Amarildos, Claudias, Fabianas entre outros tantos que não chegam ao nosso conhecimento, pode um dia ser a minha dor.

Se um dia eu for esbofeteado pela mão pesada desta “justiça”, que não é cega, nem muda, nem surda, o que terei que fazer? Fazer justiça?

Silvio Coutinho

sábado, 3 de maio de 2014

O causo dos cinco centavos



Acorda, menino, dizia minha mãe.
O celular havia despertado e João continuava a dormir. Se não fosse por sua mãe teria perdido o horário de ir para o trabalho.
João acorda às 6 da manhã e vai cambaleado até encontrar o interruptor e conseguir acender a luz de seu quarto. Logo em seguida vai ao banheiro, vê sua cara amassada pela a noite mal dormida no espelho, assusta-se, mas finge que é normal. Escova os dentes, lava o rosto e volta para quarto ainda com sono. Mas a vida de adulto imposta por um sistema de desigualdade diz que ele não pode voltar para o aconchego da sua cama.
Então ele veste sua roupa, pega sua mochila, seus óculos e sua carteira e caminha até a rodoviária (o sistema diz que se João trabalhar duro, logo ele poderá ter seu próprio meio de transporte). Mas enquanto isso não acontece João continua a depender de um transporte público de má qualidade para chegar ao trabalho.  Logo João pensa: “Eu estou trabalhando pouco ou o sistema mentiu para mim.”
Assim que chega à rodoviária, João inspira e expira fundo tentando manter-se calmo diante da enorme fila que se forma e ele se pergunta: “Será que morreu alguém? Será que estão distribuindo algo? Será inscrição para consegui uma moradia?”. Não! São apenas trabalhadores que vão para seus respectivos empregos.
João entra na fila indignado e vai resmungando com sua consciência até a porta do ônibus, sobe os degraus, pega o dinheiro de sua carteira e o entrega ao motorista. João espera pelo seu troco e o cartão. Ele recebe ambos, olha o cartão, nada de mais, confere e o troco e pera lá! Tem algo errado aqui. Faltam cinco centavos! João reclama ao motorista.
 _ Faltam cinco centavos. O motorista olha com ar de perturbação. Olha sua caixinha de moedas pega cinco centavos entrega a João e diz:
 _ Traga o dinheiro trocado! Não temos troco.
 _ A responsabilidade não é minha. Garanta-me um lugar para viajar sentado que eu trago o dinheiro trocado.
João passa pela catraca, encosta-se em uma das poltronas aglomerando-se há tantos outros trabalhadores e estudantes que saem cedo de suas casas e veem-se “obrigados” a aceitar tamanho desrespeito. Paga-se caro por um transporte de má qualidade, precário e com funcionários em muitas das vezes mal educados.
Não é pelos cinco centavos, fazendo alusão as manifestações do ano passado, mas pelo respeito ao cidadão que paga pelo serviço que utiliza. Este modo de produção injusto e desleal chamado [capeta]lismo e seus ismos (alusão a outrem) acentua as desigualdades, é desumano e estamos a mercê de seus mandos e desmandos. Refiro-me neste texto a empresa de transporte Reunidas Paulista que transporta e transborda desrespeito colocando em circulação ônibus em péssimas qualidades de uso ofertando risco “gratuito” àqueles que assim como João dependem de seus serviços. Mostro aqui a minha indignação perante os desrespeitos dessa empresa quanto aos cidadãos castilhenses. Entretanto, assim como tantos outros, estou de mão atadas perante o monopólio do transporte em nossa região. Estes porcos enriquecem cada vez mais as nossas custas e o que querem é que nos calemos e nos sujeitemos a tudo como cães com o rabo entre as pernas.

Rodrigo Costa